O Modelo Padrão da física de partículas é a teoria que descreve as forças fundamentais e as partículas elementares que compõem o universo. Dentro deste modelo, as partículas elementares são classificadas em dois grupos principais: férmions e bósons. Os férmions, que constituem a matéria, subdividem-se em quarks e léptons.
Os léptons são partículas fundamentais que não sofrem interação forte, ao contrário dos quarks que compõem os hádrons (como prótons e nêutrons). Existem seis tipos de léptons, organizados em três gerações: o elétron ($e$), o múon ($\mu$) e o tau ($\tau$), cada um com sua respectiva partícula de neutrino: o neutrino do elétron ($\nu_e$), o neutrino do múon ($\nu_\mu$) e o neutrino do tau ($\nu_\tau$). Os léptons possuem carga elétrica (exceto os neutrinos, que são eletricamente neutros) e participam de interações eletromagnéticas, gravitacionais e fracas.
Os neutrinos são partículas subatômicas de massa extremamente pequena e sem carga elétrica, tornando-os quase indetectáveis. Eles interagem apenas através da força gravitacional e da força nuclear fraca, a mais efêmera das forças fundamentais, o que lhes confere a capacidade de atravessar a matéria quase sem ser notados. Essa característica levou o físico Frederick Reines a chamá-los de “fantasmas do universo”.
A descoberta dos neutrinos
A existência dos neutrinos foi inicialmente postulada por Wolfgang Pauli em 1930 para explicar a aparente violação da conservação de energia e momento no decaimento beta, um tipo de decaimento radioativo. No decaimento beta, um nêutron se transforma em um próton, emitindo um elétron e um antineutrino do elétron ($\bar{\nu}_e$). Esse processo é mediado pela força nuclear fraca.
Antes da proposta de Pauli, a observação do decaimento beta revelou que a soma das energias e dos momentos do elétron e do próton resultantes não correspondia à energia e ao momento iniciais do nêutron. Essa discrepância sugeria uma violação das leis de conservação de energia e momento, algo considerado inaceitável na física. Para resolver esse dilema, Pauli propôs a existência de uma terceira partícula, neutra e muito leve, que carregaria o restante da energia e do momento, mantendo assim a conservação dessas grandezas.
Essa partícula, que foi batizada de “neutrino” por Enrico Fermi em 1934, permaneceu teórica até ser confirmada experimentalmente em 1956 por Frederick Reines e Clyde Cowan, que detectaram os neutrinos provenientes de um reator nuclear. Este feito monumental valeu a Reines o Prêmio Nobel de Física em 1995. A partir daí, a pesquisa sobre neutrinos se expandiu significativamente.
Devido à sua natureza evasiva, detectar neutrinos é uma tarefa extremamente desafiadora. Eles raramente interagem com a matéria, o que significa que é necessário um grande volume de material para capturar um número significativo de interações. Os observatórios de neutrinos, portanto, são construídos em locais isolados e utilizam grandes volumes de materiais específicos para detectar esses eventos raros.
Um dos métodos mais comuns de detecção de neutrinos é através do uso de grandes tanques de água pura ou gelo. Quando um neutrino interage com uma molécula de água ou gelo, ele pode produzir uma partícula carregada que se move mais rápido que a velocidade da luz no meio (embora ainda mais lenta que a velocidade da luz no vácuo), gerando um “cone de luz” conhecido como radiação Cherenkov. Essa piscada de luz, chamada de cintilação, é captada por sensores fotomultiplicadores distribuídos ao redor do tanque de água ou no gelo, permitindo a detecção do neutrino indiretamente.
Oscilações de neutrinos e massa
Por muitos anos, acreditou-se que os neutrinos eram partículas sem massa, conforme sugerido inicialmente pelo Modelo Padrão. No entanto, a descoberta das oscilações de neutrinos — a mudança de tipo (ou “sabor”) de um neutrino à medida que ele viaja — implicava que os neutrinos devem possuir massa, embora muito pequena. Esta descoberta foi confirmada pelo experimento Super-Kamiokande no Japão e pelo Observatório de Neutrinos de Sudbury no Canadá, ambos recebendo o Prêmio Nobel de Física em 2015.
A oscilação de neutrinos não só desafiou a suposição original do Modelo Padrão, mas também abriu novas questões sobre a natureza da massa dos neutrinos e suas implicações na cosmologia e física de partículas.
Por que eles são importantes?
Os neutrinos desempenham um papel crucial em vários fenômenos astrofísicos. Eles são produzidos em abundância em reações nucleares, como as que ocorrem no interior das estrelas, incluindo o Sol, bem como em eventos cataclísmicos como explosões de supernovas. A detecção de neutrinos provenientes da supernova 1987A forneceu dados valiosos sobre os processos internos dessas explosões estelares.
Além disso, a observação de neutrinos pode fornecer percepções sobre processos que não são visíveis por outros meios, devido à sua capacidade de atravessar a matéria. Isso torna os neutrinos uma ferramenta poderosa para sondar o universo de uma maneira única, complementando a astronomia tradicional baseada em luz.